quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Plano de saúde não pode fixar limite de despesa hospitalar

É abusiva cláusula que limita despesa com internação hospitalar, segundo decisão da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para os ministros, não pode haver limite monetário de cobertura para as despesas hospitalares, da mesma forma que não pode haver limite de tempo de internação.

A tese foi fixada no julgamento de recurso especial contra decisão da Justiça paulista, que considerou legal a cláusula limitativa de custos. Em primeiro e segundo graus, os magistrados entenderam que não havia abuso porque a cláusula estava apresentada com clareza e transparência, de forma que o contratante teve pleno conhecimento da limitação.

Contudo, a Quarta Turma entendeu que a cláusula era sim abusiva, principalmente por estabelecer montante muito reduzido, R$ 6.500, incompatível com o próprio objeto do contrato de plano de saúde, consideradas as normais expectativas de custo dos serviços médico-hospitalares. “Esse valor é sabidamente ínfimo quando se fala em internação em unidade de terapia intensiva (UTI), conforme ocorreu no caso em exame”, afirmou o relator, ministro Raul Araújo.

O ministro ressaltou que o bem segurado é a saúde humana, sendo inviável a fixação de um valor monetário determinado, como acontece com o seguro de bens materiais. “Não há como mensurar previamente o montante máximo a ser despendido com a recuperação da saúde de uma pessoa enferma, como se faz, por exemplo, facilmente até, com o conserto de um carro”, explicou Araújo.

O relator lembrou que a própria Lei 9.656/98, que estabelece as regras dos planos privados de assistência à saúde, vigente à época dos fatos, vedava a limitação de prazo, valor máximo e quantidade na cobertura de internações simples e em centro de terapia intensiva.

Por essas razões, e “em observância à função social dos contratos, à boa-fé objetiva e à proteção à dignidade humana”, a Turma reconheceu a nulidade da cláusula contratual.

Liminar

A ação inicial foi ajuizada pela família de uma mulher que faleceu em decorrência de câncer no útero. Ela ficou dois meses internada em UTI de hospital conveniado da Medic S/A Medicina Especializada à Indústria e ao Comércio. No 15º dia de internação, o plano recusou-se a custear o restante do tratamento, alegando que havia sido atingido o limite máximo de custeio, no valor de R$ 6.500.

Por força de decisão liminar, o plano de saúde pagou as despesas médicas até o falecimento da paciente. Na ação de nulidade de cláusula contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais, a empresa apresentou reconvenção, pedindo ressarcimento das despesas pagas além do limite estabelecido no contrato, o que foi deferido pela Justiça paulista.

Dano moral

Ao analisar o pedido de indenização por danos morais e materiais, o ministro Raul Araújo ressaltou que ele se refere à recusa pela seguradora à cobertura do tratamento médico-hospitalar. Ele destacou que a morte da segurada não foi decorrente dessa recusa, pois o tratamento teve continuidade por força de decisão liminar. Assim, o processo não aponta que a família da segurada tenha efetuado gastos com o tratamento.

Quanto ao dano moral, o relator destacou que a jurisprudência do STJ considera que o mero inadimplemento contratual não gera danos morais, mas que ele dever ser reconhecido quanto houver injusta e abusiva recusa de cobertura pela operadora de saúde, extrapolando o mero aborrecimento. No caso analisado, os ministros entenderam que houve dano moral pela aflição causada à segurada.

Em decisão unânime, a Turma deu provimento ao recurso especial para julgar procedente a ação e improcedente a reconvenção. Foi decretada a nulidade da cláusula contratual limitativa, tida como abusiva. O plano de saúde foi condenado a indenizar os danos materiais decorrentes do tratamento da segurada, deduzidas as despesas já pagas pelo plano, que também deve pagar indenização por danos morais. O valor foi fixado em R$ 20 mil, com incidência de correção monetária a partir do julgamento no STJ e de juros moratórios de 1% ao mês, a partir da citação.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Macunaíma veste a toga: O bacharelismo tão bem retratado por Mário de Andrade encontra no STF sua expressão mais acabada

O JULGAMENTO DO Recurso Extraordinário apresentado pelo agora ex-candidato Joaquim Roriz ao STF contra decisão do TSE que negou seu registro de candidatura ao governo do Distrito Federal com base na chamada "lei da ficha limpa" foi didático para entender por que o Judiciário brasileiro é tão ruim.
O fato de Roriz ter renunciado à candidatura, com isso esvaziando a questão, não desfaz o espetáculo a que se assistiu.
Há tempos todos os ministros sabiam que haveria empate e que a questão não seria resolvida. Apesar disso, empurraram o assunto com a barriga. Roriz (assim como todos os que se encontrem em situação semelhante) poderia concorrer.
Quando, afinal, o STF voltasse à questão, alguns desses políticos teriam sido eleitos. Não faltaria quem, no próprio STF, viesse argumentar que a corte não pode se superpor à "voz das urnas".
Se, a partir daí o eventual leitor deduzir que tudo não passa de teatro, acertará. O STF, como todo o Judiciário brasileiro, navega num dilúvio de palavras ociosas.
O jogo de cena começa, é claro, com os advogados. No caso de Roriz, juntaram numa mesma peça um bricabraque de alegações desconexas, na tática do que grudar grudou.
O que se extrai do palavrório indigente, das menções às "lições dos mestres", dos adjetivos encomiásticos empregados para se referirem uns aos outros, das intermináveis referências aos mesmos precedentes redigidos medievalmente, o que se extrai, dizia, são alegações no geral indigentes, às quais os ministros atribuíram respeitabilidade despropositada e aduziram suas próprias folhudices.
O fato de a maior parte dos argumentos não fazer sentido (o da presunção de inocência, o da renúncia como "ato jurídico perfeito" etc.) não impediu que cada ministro se estendesse (embora uns menos do que outros, cabendo salvar as duas ministras) em laboriosas explicações sobre por que o nonsense expresso pelos advogados era nonsense. Que um o fizesse, tudo bem. Os demais, contudo, poderiam referir-se ao primeiro e pau na máquina.
Mas não: os ministros são viciados naquele linguajar insuportável que, entre eles, passa por sapiência -em certos casos, brandido por quem exibe evidente dificuldade de leitura.
O bacharelismo tão bem retratado por Mário de Andrade na "Carta pras Icamiabas", enviada por Macunaíma à sua aldeia de origem, encontra no STF sua expressão mais acabada.
A doença não é apenas retórica, mas antes conceitual. O fiasco se alimentou da ideia esdrúxula, primeiro apresentada por Dias Toffoli e depois desenvolvida por Gilmar Mendes, de que "processo eleitoral" não seria algo que começa num momento e termina em outro, mas algo intangível, vago, inefável.
Na hermenêutica toffolo-mendesiana, "processo" não procede, existe atemporalmente. A partir disso, é claro que a inferência leva à inaplicabilidade da lei às eleições deste ano.
Não são necessárias 14 horas para desenvolver tal arremedo de raciocínio. E, caso os ministros de fato se preocupassem em discutir coisa com coisa, não seriam necessários mais do que alguns minutos para destruí-lo.

CLAUDIO WEBER ABRAMO é diretor-executivo da Transparência Brasil

domingo, 7 de setembro de 2008

Ótimo texto. Vale a pena refletir e divulgar:

Pessoas e postes ... de Ricardo Lengruber Lobosco (Pastor da Igreja Metodista de Friburgo/RJ)

Nesse tempo de campanha eleitoral, há muito que se observar. Mais importante do que as campanhas explícitas dos candidatos, creio sejam as atitudes que norteiam os passos e as palavras dos mesmos.
É inegável que a lei eleitoral inibiu satisfatoriamente, por exemplo, os exageros irresponsáveis das campanhas. Já não se vê – como antes – ruas sujas por “santinhos”, paredes pintadas e coladas, placas espalhadas por todos os cantos. A poluição visual de uma campanha eleitoral diminuiu significativamente!
Mas tenho me incomodado com algo aparentemente sem importância para muitos. Fico constrangido com tanta gente segurando placas nos semáforos e nas esquinas da cidade. Foi uma maneira de não violar a lei e continuar nos submetendo ao massacre da publicidade desprovida de inteligência.
Se me provarem que são partidários que se interessam por política, acreditam em seus candidatos e trabalham para elegê-los, ficarei menos incomodado. Mas me parecem pessoas pagas para tal ocupação. Pior: parecem-me jovens e idosos (em sua maioria) desempregados que vêem na campanha a chance de ganhar uns trocados para a sobrevivência.
Não há nada de indigno nisso, se visto pelo lado de quem precisa trabalhar e não encontra chance no mercado. Mas se contemplado pelo ângulo de quem almeja um cargo político, a mim diz muita coisa.
Diz, por exemplo, o que pensa esse candidato sobre emprego e trabalho. Se, em campanha, que em geral se maqueia a realidade, o candidato é capaz de expôr um ser humano a horas ininterruptas segurando uma foto sua, imagine o que fará com uma caneta na mão para assinar contratos e acordos que redundem em realidade para a vida das pessoas.
Não posso crer que uma pessoa que usa adolescentes para balançar bandeiras de campanha (sem sequer um sorriso no rosto) seja uma pessoa que verdadeiramente respeite o ser humano!
Não posso concordar que uma campanha dependa de fotos e cartazes para eleger alguém. Campanha publicitária se faz para vender produtos e serviços e para tornar conhecida uma marca. Candidatos devem ser votados por “já” serem conhecidos e acreditados por sua comunidade. Candidatos não são marcas a serem escolhidas. Candidatos são pessoas nas quais acreditamos ou não!
Fico triste em saber que vivo num país em que pessoas têm de se submeter a hastear com seus corpos peças publicitárias. Lamento, porque isso diminui as pessoas e as leva ao lugar aonde trabalho não é sinônimo de produção, de serviço ou de doação. Trabalho passa a ser uma pena!
Preferiria votar em quem me mostrasse em campanha o valor que realmente dá ao trabalho humano, já que essa é uma área que, de modo consistente, pode mudar a vida e a sorte das famílias.
Preferiria votar em quem me convencesse que quer romper com o ciclo de sub-empregos e trabalhos indignos a que tem de ser submetida a maior parcela da população brasileira.
Se tivesse que escolher, preferiria votar em quem usasse postes em lugar de seres humanos!
Aos que precisam dessa ocupação, espero que tenham mais sorte em encontrar uma atividade segura que lhes dê trabalho e renda de forma mais duradoura.
Aos que julgam precisar dessa forma de propaganda para se elegerem, profiro, publicamente, meu lamento e minha indignação!

Em quem vou votar ...

Antes de começar o alarido da campanha municipal, já estou me preparando psicologicamente para decidir meu voto. Por causa disso, passo a refletir sobre o que segue.
Votei quase tantas vezes para presidente quanto minha mãe ou meu pai. Significa dizer que minha geração é bem mais experiente em termos eleitorais do que qualquer outra precedente, que ainda viva! Isso faz ver duas questões complexas: primeiro, a experiência político-eleitoral é muito recente no país; segundo, os vícios das ditaduras são, ainda, perceptíveis.
Daí a urgência de uma reflexão sobre decisões a serem tomadas no próximo pleito. Não que alimente a ilusão de uma mudança expressiva, já que as pessoas que concorrerão aos cargos, ainda que sem saber, carregam as marcas de uma ou duas gerações estragadas politicamente pelos anos de ferro dos governos militares; almejo, somente, cultivar a esperança de dias melhores.
Não desejo entregar meu voto a quem almeja a política como meio de vida. Não gostaria de ser governado ou de ter sobre meus ombros leis propostas por legisladores que galgaram suas colocações por meio de uma “carreira política”. O que significa que quero olhar para a história do meu candidato: no que trabalha? Em que é reconhecidamente bom no que faz? Como é seu nome na praça? Por que acreditar em alguém que só tem como currículo uma “carreira política”? Carreiras se fazem à base de trabalho. Política não é trabalho, é serviço!
Mas não quero confiar meu voto, por outro lado, a quem seja aventureiro na política. Simplesmente porque é “muito conhecido” saiu candidato dada sua popularidade, ou por conta de sua expressividade numa ou noutra área. A história brasileira está eivada de nomes assim; pessoas que vieram à tona graças a um feito de repercussão pública, mas ao se tornarem eleitos, repetem sistematicamente a rotina desoladora da tal “carreira política”.
Meu voto não será dado a quem continuar na postura tão recorrente no país de fazer do palanque eleitoral uma tribuna de acusação da vida e das propostas alheias. Estou cansado da política de competição e de tão pouca proposição. Quero ouvir propostas sérias e consistentes. Quero decidir pelo candidato que me convença argumentativamente. Que me mostre uma análise de estrutura do município capaz de revelar seus entraves; que me esclareça sobre um plano de ação claro e, sobretudo, exeqüível.
Não entregarei meu único voto a quem fizer alianças simplesmente com vistas à eleição. A história recente me mostrou que isso não funciona! O Estado não pode ser mais visto como loteamento político. Não posso mais conviver com a realidade de ver os recursos oriundos dos impostos pagos por mim serem utilizados em pastas governamentais administradas por pessoas incapacitadas para os respectivos cargos. Não posso mais concordar que o que importa é estar no governo. O que importa, na verdade, é ter condições para governar.
Quero empenhar meu voto e minha confiança em quem mostre o rosto de verdade. Em quem me diga a que veio; em nome de quem veio; com que objetivos veio; até onde quer caminhar; o que quer dar de continuidade do que aí está; o que quer deixar de rastro para seu sucessor dar prosseguimento. Não posso mais acreditar em messianismos ingênuos e oportunistas. Não acredito em “salvadores da pátria”!
Quero que meu candidato me diga porque está no seu partido. Primeiro, quero saber que partido é esse: é simplesmente uma legenda para essa eleição? Depois, quero saber quem é esse sujeito na história dessa agremiação política. É claro que no Brasil isso é muito relativo, mas não posso mais votar em pessoas isoladamente; preciso conectar meu voto a quem está com ela e quem ela representa efetivamente. Não posso deixar de investigar os “amigos ocultos” do meu candidato.
Preciso ter a certeza de que meu candidato fará de seu mandato um compromisso com seus eleitores. Permanecerá no cargo até o fim, ou o fará de trampolim para a eleição seguinte? Não posso compactuar, por meio de meu voto, com esquemas para êxitos pessoais ou para ascenção na “carreira política”.
Gostaria de saber quanto meu candidato vai gastar em sua campanha. Se, em campanha, não tiver clareza sobre o uso dos recursos, porque teria confiança em que isso acontecerá depois de eleito? Para decidir com tranqüilidade meu voto, quero saber de onde vêm esses recursos. Quem são seus colaboradores? Por que estão tão interessados em sua eleição? Não posso comungar meu voto com quem não comungo alguns outros valores que considero vitais.
Meu candidato não precisa dominar tudo, mas exijo que ele me convença de que sabe sobre o que está falando, especialmente em termos de administração pública, de saúde e de educação. Não quero mais negociar essas premissas básicas.
Quero ver no meu candidato um engajamento sócio-ambiental sério; que contemple seriamente questões de natureza eco-ambientais. Alguém que saiba do que fala, sem repetir o discurso cansativo dos ambientalistas de plantão!
Vou votar em quem me mostrar que Estado é capaz de dar oportunidades verdadeiras a quem mendiga o pão de cada dia, a quem está por fora da economia; votarei em quem me mostrar que a classe média terá paz para trabalhar.
Não vou votar em quem fizer uma campanha de ruas sujas. Não quero ver o rosto do meu candidato estampado em carros, postes e janelas. Quero me convencer que as pessoas o conhecem e decidiram por votar nele por estarem grávidas de confiança e não porque foram consumidas por sua propaganda.
Parece demais, mas estranho é que tenhamos que reivindicar ainda em 2008 essas premissas básicas de um candidato. Isso deveria ser imposição de lei!
No momento em que escrevo este texto, ainda não sei quem serão os candidatos, por isso escrevo sem medo de tocar em ninguém, mas basicamente meu voto em 2008 exigirá: a) saber em quem estou votando; b) conhecer claramente sua proposta efetiva de trabalho; c) confiar em sua honestidade e d) acreditar que fará algo realmente diferente!

Espero ter em quem votar, realmente!